Ao nascermos todos nós recebemos um tempo cujo comprimento
nos é desconhecido. A ampulheta da vida virou do lado oposto e os grãos de
areia não param de derramar. Por vivermos em um contexto histórico onde a comunicação
vence o espaço físico e a tecnologia torna o dia-a-dia mais ágil, pensamos que
tudo ao nosso redor está correndo e, por isso, interpretamos que precisamos
correr também.
Passamos a fazer muitas atividades, a nos cobrar mais, a
querermos está sempre atualizados e acompanhando as tendências, muitas vezes, opressoras. Quase sempre temos a sensação de que estamos ficando para traz
nesta corrida e, nem percebemos que a ampulheta continua a derramar areia na
mesma velocidade. Mas a impressão que temos é que a vida está passando rápido
demais. Porém, nós é que estamos correndo sem nos dar conta de que muito do que
fazemos se tornou automático e nos robotizou.
Perdemos o lado humano da vida e a capacidade de aproveitar profundamente
cada momento que nos acontece. Não respiramos mais direito, porque estamos
ofegantes demais para inspirar e expirar e sentir o vento mexer nosso cabelo. O
relógio nos apressa e tira a possibilidade de sentirmos o prazer de um instante
de laser, de um mergulho em um livro, da audição de uma canção.
O transito nos condiciona a uma atenção cercada de medo,
porque as pessoas estão estressadas e nos contagiam com inquietação e
ansiedade. Os meios digitais de comunicação nos tornaram exigentes demais com a
velocidade na troca de dados e informações, no entanto ficamos negligentes com
a qualidade desta interlocução e com ela perdemos a riqueza da expressão
corporal e da entonação ao falar. Quanto vale a conexão de um olhar quando este
se une com palavras?
Nos permitimos esvaziarmos do nosso eu para vivermos sem
fronteiras espaciais. Revelamos nossos segredos e registramos no mundo virtual,
esquecendo-nos do eu que vive em mim no mundo físico e real. Não vemos passar o
nosso próprio ser na frente de nós e quando temos nosso poucos instantes de
reflexão, percebemos o quão vazio nós estamos, simplesmente para estarmos
conectados com a velocidade de um mundo que não existe.
E nossa habilidade de analise e de desenvolver a
auto-reflexão? Achamos que isso é coisa de filósofo e não compreendemos mais
onde foi que nos perdemos nessa corrida contra o tempo. Aliás, não deveríamos correr
contra o tempo e sim na medida em que ele acontece, pois só assim receberemos
os benefícios que o tempo nos oferece, se nós estivermos prontos para isso.
Quando o tempo é acompanhado da reflexão, ele nos presenteia
com o amadurecimento. Se o tempo se depara com os conflitos, ele possibilita o
encontro da experiência com o perdão. O tempo nos torna serenos, mais sensatos,
nos ensina que na beleza da paciência encontramos o valor da ponderação e nos
tornamos comedidos e disciplinados. O tempo é capaz de regenerar um corpo ferido
e uma alma ofendida e de minimizar sentimentos explosivos, como a raiva, e
selvagens, como o ódio, além de coibir comportamentos, como a impulsividade e o imediatismo. Porém, se dermos ao tempo ferramentas negativas, ele
encherá nossos armários emocionais de ressentimentos e aniquilará nossa
capacidade de amar e de sorrir. E se não dermos nada ao tempo? Nos tornaremos
meros espectadores que aguardam os dias passarem e que, por nada produzirem,
colherão, no marasmo, a infelicidade de uma vida infrutífera.
A nós cabe a responsabilidade de administrar o nosso tempo
enquanto a ampulheta continua a derramar cada grão de areia. O que é prioridade
deverá ser o primeiro a caminhar junto com o tempo. O que não é necessário e
que faz mal ou tira de nós a alegria de cada momento, isso deverá sair do nosso
tempo. Enquanto caminhamos nos grãos de areia, tiremos da ampulheta a ira, a
mágoa, a ansiedade e a tristeza até que o ultimo graozinho caia e, finalmente,
conclua nosso tempo.
Jandmara Lima
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